Quando fui embora


 

Quando fui embora

Vivi como sabia viver

Criei vários de mim 

Fragmentei-me nos meus mais diversos eus

Disse o que podia

Sofri o que não queria

Tudo em prol da minha própria poesia.


Quando fui embora

Ainda não sabia quem era

Vivi como sabia viver

Dando para cada um 

O eu que lhes apetecia

Mas nunca nada eu merecia.


Quando fui embora 

Perdi-me

Não sabia quem era

Vivi como sabia viver

Criando em cada cena 

Uma nova parte minha

Que até eu mesmo desconhecia.


Quando fui embora

Chorei por não ser quem eu era

Um grande preso num corpo pequeno

Sofrendo a esmo 

Com tanto talento, preso em mim mesmo.


Quando fui embora

Decidi ir para mais longe

Olhei para o paiol 

Desejei o mundo a fora

Olhei para o penhasco

O que me impulsionou a sair do frasco…


Alguns anos depois 

Olho-me no espelho

Pergunto-me: quem sois?

E escuto este conselho…

Ora vive, faz o teu… 

A aurora renasceu

Tu vives de novo, nobre centelho

Não precisa dar nome aos bois.

0 comentários: