Triz



Chegamos ao limite.
Eu estou aqui contornando o abismo, me controlando, me enrolando.
O cinza do céu se une com o cinza das rochas, grandes e profundas rochas.
Eu não lembro porque eu acordei, na verdade eu nem lembro da última vez em que dormi.

Eu estou no limite, na ponta, na beira, na linha final.
Além daqui há apenas o abismo, um milímetro a mais e eu escorrego.
E essa sensação de estômago recém acordado jorrando dentro de mim.

Eu me enrolo, me desespero, supero e espero.
Não há nada que eu possa fazer.
Apesar de estar no limite entre o mundo e o precipício eu não tenho a opção de pular.
Eu sento, vigio, espio e prossigo nessa dor que queima como um cigarro mal tragado.


Sem mais



Olha, eu não vou dizer nem sim e nem não. 
Primeiro porque eu não devo respostas, e mais, não entendo o que você quer.
Você nunca foi clara, sempre dando voltas, sempre indo e vindo.
Eu sempre volto àquele riacho onde costumávamos ir, a estação do ano nunca nos impediu de irmos lá e esquecermos do mundo. Eu sempre gostei do início do outono quando as folhas começavam a cair, ainda tenho fotos daquela época. Sim, eu ainda vou lá, mas não é mais a mesma coisa... E eu nem quero que seja. Eu aprendi que agora é melhor ir sozinho. E se você ainda vai lá, por favor, não me conte. 
Sabe, tem estado tão frio ultimamente, eu não sei me livrar das dores no ombro. Lembra quando essas dores não existiam porque seus braços ficavam envolvidos em meu pescoço? 
Eu estou fazendo isso de novo, não é? Nostalgiando. Vou parar, eu prometo. 
Desculpe por não te deixar falar... É que eu ouvi tanto vindo de você que agora eu não quero mais ouvir, e também nem gostaria de estar falando. Você vem com essas perguntas absurdas de cabeça de mulher e faz eu me enrolar até mesmo para contar as minhas verdades. 
Existe um motivo para não nos falarmos mais, e o motivo é que, mesmo talvez você não sabendo, me falaram que eu fazia parte dos seus planos, e eu acabei caindo na armadilha... O ruim não foi eu ter caído na sua armadilha e sim existir uma armadilha para que eu caísse. Você não precisava disso, sempre soube que eu iria até você. E graças a isso eu nunca mais te vi. 
E é por isso que eu não vou dizer nem sim e nem não. Eu não vou responder nenhuma pergunta sua, não mais.
E por mais que eu quisesse que sua voz doesse em meu peito e rebrotasse a minha memória isso não acontece mais. 
Por isso não perca seu tempo me chamando, gritando, vindo atrás... Não surte efeito. 
Me desculpe por não mais sentir. Eu não queria que fosse assim. Se você me afastou agora viva sem mim. 


"Você pede que eu volte e nessas idas e vindas o amor enfraquece. Enfraquece até o fim."

Biblioteca das memórias III


Sabe, eu dei uma andada por ai e visualizei algumas coisas, revi outras e está na hora de tirar da estante aquelas histórias de aventura mal planejadas que evidentemente não deram certo. Ou aquelas vezes em que você não teve controle algum, só teve que esperar e ver o pior acontecer. Eu não sei porque eu, até então, deixo essas histórias arquivadas tão na frente da minha estante se todas as vezes que eu passo rapidamente por ali meu peito aperta novamente. 
Tem tanta coisa no passado, tantas histórias... Mas não tem como ficar carregando tudo isso comigo a cada passo que eu dou. Acabou o espaço, ou eu me prendo nas histórias que tanto me fazem sofrer ou eu libero o espaço.
E é isso. Estou liberando o espaço. Tudo que está acumulado está indo embora e pela primeira vez eu não me importo. E eu acho que é porque eu estou vivendo uma tranquilidade constante, nada turbulento como minhas outras histórias que oscilavam de cinco em cinco minutos. 
Eu sei que na minha história tem diversos personagens, muitos deles eu me importo até mais do que eu devia me importar, mas eu tenho que deixá-los ir e também seguir outras histórias. Por mais que me doa, acabou. 
Sei também que ainda existem muitas sombras no passado, mas eu não posso mais me prender nelas.
Às histórias que vierem a tona a partir de agora, só lamento... Não há mais espaço, não há mais explicação, simplesmente se foi...

Eu estou melhor agora. Reciclando espaços.